http://pt.wikipedia.org/wiki/Templo
Muitos lugares são chamados de templo, talvez por sua simbologia estética ou pela tradição em serem vistos como tal. Pouquíssimos lugares realmente são considerados templos. Estes são lugares que despretenciosamente nos trazem a sensação de pertencer a algo maior.
Um restaurante com um toque de jazz, com um ar um tanto rústico e internacional, escondido por um corredor estreito no interior de Minas Gerais. O Aluarte, tradicional restaurante em Tiradentes: idealizado, dirigido e temperado por Pedro Fernandes (meu tio). Este é o momento em que todos pensam: "Eita tietagem." Não se trata disso... aliás, está muito além disso. Está na sensação de pertencer.
Venho de uma família chamada Fernandes. Uma família que no Brasil, foi iniciada pelo Davi e pela Clara. Uma família que possui uma relação especial com cozinhar e comer e faz disso um ato de amor, hospitalidade e bem-estar. Falando no qual... minhas primeiras lembranças desta sensação estão guardadas na cozinha da Dona Lígia, onde sempre tinha algo no fogo e praticamente nada era "pré-fabricado" (tá bom... o guaraná Tupí e outras coisinhas não eram feitos lá). Onde o Seu Pedro sentava sempre entre a parede e uma mesa redonda, enquanto apelidava as amigas de Lígia com nomes do tipo "Coruja Velha."
Pedro e Lígia tiveram três filhos: Celso (meu pai), Pedro Sérgio e Célia Regina (meus tios). Todos herdaram o gene da culinária, apesar do papai lembrar dele apenas para sobrevivência. Já a tia Célia faz dele um gesto de amor e carinho para/com a família, amigos e visitas.
Voltando ao Aluarte...
O tio Pedro foi o único a fazer desta hospitalidade "Fernandina", uma profissão. Há mais de duas décadas ele resolveu abrir a porta de sua casa e receber seus visitantes na intimidade e aconchego de sua cozinha, assim como fazia a Dona Lígia. Assim como na casa de meus avós, as pessoas mais importantes da minha vida passaram pelo Aluarte. Não só passaram, como estiveram lá durante longas horas, que rápidamente se passavam. Não só estiveram lá, como sempre retornaram.
Desde muito antes de ser capaz de entender o significado disso, eu já dormia nos sofás do restaurante, assim como fazia na casa de meus avós. Hoje aos 26 anos, já não durmo no sofá do Aluarte (bem... quase nunca...), mas também desfruto das tradições da casa: sentar na cozinha ao lado do fogão á lenha... ao som do saxofone do Seu Sacramento... conhecendo os visitantes que passam por lá... ouvindo e fazendo relatos de outro momento e outro lugar. Sim, tudo isso na cozinha, vendo o Pedro nos seduzir com o aroma e tempero de seus pratos, enquanto cozinha no fogão á lenha e nos conta estórias de suas viagens pelo mundo.
No dia seguinte, de tarde, enquanto o sol atravessa a janela da cozinha... o fogão é reascendido... e o tio Pedro estica as massas de sua pizza fabulosa e diz: "Essa aqui vai ficar boa. Coloquei (não vou contar o segredo)", me lembro de Dona Lígia preparando seus quitutes para o lanche da tarde. Lembro-me do Seu Pedro pegando a gente com suas brincadeiras.
A saudade é grande... infinita até... mas sei que neste instante, sinto-me em um templo... sinto-me em paz.